"hei você que tem de 8 a 80 anos
não fique aí perdido como ave
sem destino
pouco importa a ousadia dos seus planos
eles podem vir da vivência de um ancião
ou da inocência de um menino
(...)
nunca deixe se levar por falsos líderes
todos eles se intitulam porta vozes da razão
pouco importa o seu tráfico de influências
pois os compromissos assumidos quase sempre ganham
subdimensão"
trecho de como diria dylan, zé geraldo
hoje eu quero escrever meio que um diário. apesar de íntimo, acho que diz respeito a questões coletivas.
fico especialmente sensível em abril e maio, não é segredo pra ninguém que me conheça. o motivo também é sabido e apesar de eu custar a admitir, tem tudo a ver com autopiedade.
que seja. anda passando. essa introdução só está aqui como forma de, talvez, minimizar a minha covardia.
aos fatos: na escola, tínhamos decidido entrar em greve a partir de segunda-feira. uma parte da escola, quase todo o período da manhã, do qual eu faço parte.
não era um desejo intenso da minha parte, uma crença total na efetividade da coisa. depois de anos com a greve sendo comandada pelo nosso difícil presidente do sindicato, com um histórico negativo, a pelega aqui não estava animada. e mais por culpa do que por engajamento, resolvi aderir.
na mesma noite, me arrependi, mas não podia voltar atrás. sabe quando você se sente massa de manobra? minha impressão é de que a categoria está sendo usada para atender a interesses políticos muito pessoais. pq, justo agora, o sindicato está sendo tão ferrenho na defesa do movimento? não é coincidência o presidente ser oposição ao atual governo, bem como não é coincidência ele ter sido da situação no anterior.
não sou oposição. não estou totalmente satisfeita, tenho vários questionamentos, não vejo mais o partido como eu via antes, mas ainda assim, não acredito nas outras alternativas, sequer nas que se declaram mais a esquerda. não confio em vanguardas, de um jeito ou de outro, elas sempre me cheiram a elite, ainda que sob um disfarce simpático.
acho as reivindicações muito justas. não discordo de absolutamente nenhuma. mas discordo do momento e da pressa em decretar greve.
esse meu coração se ressente de falas reacionárias, especialmente daquelas que não dão a cara para bater e se disfarçam de apoio ao movimento. e agora eu vou contar da direção da escola.
ontem, durante a jeif (uma espécie de reunião diária dos professores, pra quem não é iniciado), nosso diretor foi nos fazer uma proposta, que consistia em: já que iríamos aderir à greve, que garantíssemos os dias letivos de modo a não precisar repor com os alunos depois, mas apenas as horas, durante a semana.
aqui, um aparte: dessa forma, a direção não teria que abrir a escola aos sábados para que fizéssemos uma reposição de verdade. e eu, correndo o risco de ser apedrejada, acredito em reposição de verdade.
na prática, a coisa aconteceria assim: os professores grevistas se dividiriam em dois grupos e alternariam o dia de greve, dia sim, dia não, os alunos seriam atendidos na sua totalidade ainda que sem nenhuma qualidade e enlouquecimento total dos 3 professores presentes no dia (somos 7 no total), que teriam de dar conta de todo um turno sozinhos.
reagi de uma forma que nunca esperei: voltei atrás. fui desonesta e usei a proposta dele para me dar um suporte. pior, não tive sequer coragem de me posicionar enquanto ele estava na sala. fiquei intimidada, não tive coragem de contar a ele o absurdo que achei daquela proposta, o quanto ele estava sendo desonesto por, na frente do comando de greve apoiar totalmente o movimento e depois vir com uma daquelas... fui cuzona. isso mesmo: cuzona.
saí da escola achando que tinha sido a melhor decisão. e depois, de novo em casa sozinha, fiquei pensando e repensando em tudo e me dando conta de que sim, eu podia ter mudado de ideia, mas devia ter tido coragem para ser honesta com meus amigos de trabalho. e que eu devia ter dito tudo que pensava, naquele momento mesmo, ao diretor. ainda que eu tivesse que ouvir que sou briguenta e não sou fácil de lidar. a sensação de não ser aceita do jeito que sou seria bem mais fácil de lidar do que essa sensação de não ter sido quem eu sou, ou pior ainda, a sensação de "será que é essa que sou eu?".
volto agora ao começo do post. não tenho direito de usar nenhuma dor, por mais antiga e legítima que seja, para justificar a minha covardia.