quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

minha mãe, minha filha, minha irmã, minha menina

é que ser mãe não me consumia. a gravidez não me consumiu.
fui mãe quase sozinha. digo, de amigas engravidando juntas, felizmente, pq não é recomendado que todo mundo engravide aos 19. teve a mônica, mãe até antes de mim, mas a verdade é que nossas preocupações eram outras. gravidez e maternidade, contrariando todas as expectativas, não me causava sofrimento.
ninguém teve filhos comigo. não havia comparações. nunca tive que ouvir, "fulana amamentou tanto tempo, sicrana não teve cesárea, vc viu a filha da beltrana como caga bonitinho?".
também não havia internet, redes sociais, grupos de mães, essa militância toda. não é que eu ache a militância desnecessária. é que acho que causa mais ansiedade, num período da vida em que os hormônios já estão todos briguentos. ouço os relatos, de tanta gente, e não consigo curtir. parece que o apoio acaba virando cobrança, comparação, competição. "ah, mas a minha buceta esticou taaaanto, vc não viu? a sua não?". isso gera um sentimento de inferioridade, gente. e francamente, não preciso ter a minha buceta diminuída por ninguém.
há uns meses ouvi uma crítica e percebi que era pra mim só depois de um tempo, e prefiro não contextualizar. pq não quero competir e percebi, bem assustada, que a outra mãe estava competindo comigo! mesmo com uma imensa distância de idade entre nossas filhas, parecia que todo o trabalho que minha filha não me deu, era motivo de stress pra ela, por não ser igual.
me senti estranha. como se tivesse que me desculpar, pq:
1) meu parto foi fácil, e foi cesárea, e minha recuperação foi excelente (não é uma apologia às cesáreas).
2) minha filha começou a dormir a noite toda com apenas 3 meses.
3) não me sinto culpada por ter amamentado pouco e não sinto sequer a necessidade de me explicar por isso.
4) a largada da fralda, da chupeta e da mamadeira foi tranquilíssima. posso até perder uns minutos e explicar que não houve nenhuma ansiedade da minha parte, que não segui nenhum manual de como ser mãe e que foi tudo no tempo dela.
5) sim, dei chupeta e mamadeira sem culpa.
6) sim, dei açúcar (!) e doces em geral (!!) também sem culpa. era uma outra época. talvez hoje eu não desse. ou talvez eu desse, sem exageros, como fiz na época.
7) não, minha filha não fez birra. não se jogou no chão do shopping ou do restaurante, não gritou comigo ou me bateu, não me desobedeceu ou me desrespeitou.
7.1) pelamordedeus, gente. claro que ela fez tudo isso! pq toda criança vai testar os limites e não precisa nem ser pedagoga pra saber disso. o que a pedagoga aqui fez foi manter o não todas as vezes que disse e ser bem firme sem ser violenta em todas as vezes que isso aconteceu. ainda assim, a frase que atemorizava a bea era "quando chegar em casa a gente conversa". pq quando chegava em casa a gente conversava mesmo. eu não deixava de lado por estar cansada ou com preguiça.
7.2) então, sim, ela fez tudo isso, mas não era recorrente. sinto muito que ela não tenha me dado tanto trabalho quanto as outras crianças dão para as mães e sinto mais ainda se isso incomoda, afinal, ninguém aqui tá disputando medalha.
8) levei minha filha pra botecos e festas. de novo, não sinto nenhuma culpa e nenhuma vontade de me explicar.
talvez vc esteja se perguntando se eu não sinto  nenhuma culpa. como assim, uma mãe sem culpa?
mas eu sinto. é leve pq não foi escolha (apesar de ter gente que pense que sim). quando eu fiquei doente, deprimidíssima, a gente inverteu os papéis. e com 11 anos, bea foi a mãe e eu a filha. e ela me alimentou, me deu banho, cuidou da casa, segurou a minha mão até que eu conseguisse dormir. eu não queria que ela tivesse passado por isso.
hoje eu estava lendo um livro em que a personagem principal teve depressão, e ela relatava que ninguém, por mais que a amasse foi capaz de compreender a doença. meu primeiro impulso foi pensar que eu também. daí lembrei da minha filha, que não só compreendeu tudo que eu sentia, como conseguiu até entender o suicídio, saindo da perspectiva egoísta do "mas e todos que te amam?". sim, eu tenho um puta orgulho dela.
tem outra coisa também que vai além dos princípios e da fase da vida: a bea é fácil. não quero dizer que ela é fácil de controlar, um miquinho amestrado, ou que é simplória, ou obtusa. não, ela é tranquila. nunca entendeu o impulso de um filho responder pra uma mãe (o que é mais do que eu mereço, pq nesse sentido eu era o demônio com a minha), não deu trabalho na escola, nas relações... não faz fofoca, é compreensiva. não, nada de santa. é personalidade, acho, essa coisa tão subjetiva, e é também resultado de uma relação de muito respeito.
afinal, a vida é mais fácil quando as mães entendem que os filhos são pessoas, não propriedade. que são livres para se expressar, pra fazer suas escolhas, e que o resultado dessas coisas não são ofensas pessoais para seus pais. e me orgulho de entender que minha filha, apesar do pronome possessivo, não é minha. ela é livre, ela é dela, seu corpo, suas escolhas, suas batalhas. não são minhas. quem vai ter que desenrolar é ela.
expliquei o que podia,e disse todos os "nãos" necessários e jamais infundados. como a bea mesma diz, "não pergunte nada pra minha mãe que vc não tem certeza se quer saber, pq ela vai responder".
tenho orgulho da nossa relação se basear na verdade, na confiança e nunca liguei pra quem pensa o contrário.
pq por aqui, a coisa vai muito bem, obrigada, desde que somos só nós. há mais de dez anos.

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